terça-feira, 5 de julho de 2011

DORMINDO SOZINHA - Lenda Urbana

Linda acordou com o telefone tocando na sala. Olhou em volta e notou que já era noite e pensou que estava atrasada, mas olhou no relógio e viu que ainda tinha muito tempo para chegar ao trabalho. Levantou-se da cama e foi olhar se a pessoa que ligou deixou mensagem. Ao sair do quarto viu sua filha Karem desenhando na frente da televisão.
“Oi mamãe.” – gritou a menina correndo em direção à mãe.<
Karem era uma menina muito amorosa e dedicada, desde que o pai morreu, ela tem tomado conta da mãe da melhor maneira possível. Apesar de ainda ter 11 anos era muito madura e apesar da vida dura que levava sempre estava contente.
“Você atendeu o telefone? Quem era?”
“A babá, disse que não pode vir hoje, pois esta doente.” – respondeu a menina.
Linda franziu a testa com ar de preocupação, ela não podia faltar ao trabalho, pois o dinheiro já era curto e perder um dia de trabalho no bar onde trabalhava significaria mais dividas.
“Não tem problema, eu posso ficar em casa sozinha por hoje mãe, aliás, o Predador esta aqui para me proteger.” – disse Karem olhando para o pastor alemão deitado no sofá.
“Tudo bem, qualquer coisa estranha você pode me ligar no bar e eu venho pra casa correndo.” – respondeu a mãe preocupada.
Algumas horas depois Karem se preparava para dormir, verificou todas as janelas da casa e viu que uma das janelas do sótão fechava mais não trancava, pois o pino estava quebrado. Não deu muita importância, trancou a porta do sótão e foi para o quarto.
Ela entrou no quarto e chamou Predador que veio imediatamente e deitou-se de baixo da cama como de costume. Depois que havia deitado Karem colocou a mão de baixo da cama para o cachorro lamber. Isso era como um ritual noturno que ela fazia para se sentir mais segura.
No meio da noite Karem acordou com um barulho de água pingando. O barulho parecia que vinha do banheiro que ficava perto do quarto. Ela ficou com medo, pois esse barulho não estava lá quando ela foi dormir. Colocou a mão de baixo da cama e sentiu a lambida do cachorro, sentindo-se mais segura voltou a dormir.
Algum tempo depois a garota voltou a acordar com o mesmo barulho e colocou a mão embaixo da cama para o cachorro lamber outra vez, porém não sentiu nada.
“Predador!” – sussurrou “Predador!” – sussurrou uma vez mais.
O cachorro não respondeu com a lambida. Preocupada e com medo ela olhou embaixo da cama que estava vazia. Seu corpo estremeceu, por um momento pensou em cobrir a cabeça e ficar ali, mas decidiu ir atrás do seu cachorro.
Decidiu ir primeiro ao banheiro de onde o barulho vinha. Andou lentamente com passos pequenos em direção ao banheiro e quando chegou à porta não pode conter o grito de terror, pois a imagem era brutal. O banheiro estava todo ensangüentado, o cachorro pendurado pelo pescoço com a mangueira do chuveiro na parte metálica do box, seu corpo cortado de uma extremidade a outra e seu sangue pingava no chão. Karem gritou outra vez, mas o grito foi abafado por uma mão enquanto lia no espelho a frase. “Pessoas também lambem”.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

A FOTO DE FANTASMA POLÊMICA

Advertências
- Não fixe o olhar na foto;
- Não encare os olhos da menina;
- Se começar a se sentir inquieto "feche" a foto;
- Se sentir uma incontrolável vontade de ficar olhando APAGUE a foto de seu micro.

Origem:Indonésia, durante os tumultos.
Um fotógrafo estava fazendo uma cobertura dos tumultos em um dos prédios localizados na vizinhança da "cena do crime", que também é, por coincidência, um dos locais onde eles tiveram um massacre imenso.
Ele estava tirando uma foto de um corredor vazio e isto apareceu quando os negativos foram revelados.

Fatos- O fotógrafo que tirou a foto resolveu enviá-la para estudos;
- Um fotógrafo ficou louco tentando estudar a foto por muito tempo;
- O jornal FOLHA DE SP tentou imprimir para utilizá-la em uma reportagem, nada saiu além de um corredor com uma figura borrada e irreconhecível;
- Fotógrafos especialistas dizem que é um caso raro de fotespelhotefacto onde, dependendo do foco, torna disforme outras partes da foto
- Parapsicólogos dizem que é um caso (que nem é muito raro) de Foto da Além Vida, onde podemos ver claramente a forma ainda viva de um espectro (fantasmas para nós leigos)

Comentários
- Várias pessoas dizem que não vêem nada além de um corredor vazio;
- Outras dizem que vêem várias outras figuras (muitas dessas pessoas morreram);
- Outras juram que viram a figura fazendo um sinal como se desse adeus;
- Outras ainda dizem que a figura os chamam;

"Ninguém sabe ao certo o que é verdade (nem mesmo a procedência exata da foto, sendo que o fotógrafo que a enviou preferiu ficar no anonimato), mas também é fato que após o ocorrido no jornal Folha de SP a foto vem sido difundida e muitas outras pessoas criarão outras estórias sobre ela, porém os parapsicólogos advertem pois acreditam que a energia carregada nesta foto trás juntamente a energia da menina que ainda não desencarnou e isso pode trazer vários fenômenos anamnésicos e materiais às pessoas e aos lugares onde está sendo observada (e isso explica as advertências no inicio da página)."
Resultado de imagem para a foto de fantasma na indonesia

sábado, 30 de abril de 2011

A MORTE BATE A PORTA

Numa certa noite de interior, em meio a uma roda com fogueira, muito frio e histórias de horror, um certo garoto lança um desafio ao amigo. Faremos uma aposta, eu duvido que o Marcio entre no cemitério a meia noite???? Marcio então respondeu ao amigo:
- Aceito o desafio e não só entro como ainda trago algo para comprovar que estive lá. Então a meia noite ambos foram ao portão do cemitério, o amigo para ver com seus próprios olhos que Marcio entraria. Marcio entra, e o amigo assustado com a escuridão corre de volta para casa e fica lá com os amigos esperando o retorno de Marcio.
Marcio com muito medo, começa a ouvir passos e vozes, olha para traz e nada vê somente uma enorme escuridão, com muito medo, arranca logo uma cruz do cemitério e corre desesperado de volta para casa...... ao sair do cemitério ao longe escuta gritos de desespero.
Chegando em meio ao amigos, entra em casa sorridente e mostrando a todos sua coragem, com aquela cruz na mão, prova ao amigo que não tem medo de mortos. Os dois ficam rindo da aposta..... quando adentra em casa um dos amigos dizendo:
- Marcio, o João Alves está ai fora te procurando.... ele veio buscar algo dele que está com você.
Marcio olha desesperado para o amigo e diz: - Mas eu não conheço nenhum João Alves, e no mesmo instante os dois olham para a cruz e para espanto dos dois, na lápide havia o nome... "João Alves".
FONTE: CIRCULA PELA NET

FLORES DA MORTE

Conta-se que uma moça estava muito doente e teve que ser internada em um hospital. Desenganada pelos médicos, a família não queria que a moça soubesse que iria morrer. Todos seus amigos já sabiam. Menos ela. E para todo mundo que ela perguntava se ia morrer, a afirmação era negada.
Depois de muito receber visitas, ela pediu durante uma oração que lhe enviassem flores. Queria rosas brancas se fosse voltar para casa, rosas amarelas se fosse ficar mais um tempo no hospital e estivesse em estado grave, e rosas vermelhas se estivesse próxima sua morte.
Certa hora, bate a porta de seu quarto uma mulher e entrega a mãe da moça um maço de rosas vermelhas murchas e sem vida. A mulher se identifica como "mãe da Berenice". Nesse meio de tempo, a moça que estava dormindo acordou, e a mãe avisou pra ela que a mulher havia deixado o buquê de rosas, sem saber do pedido da filha feito em oração.
Ela ficou com uma cara de espanto quando foi informada pela mãe que quem havia trazido as rosas era a mãe da Berenice. A unica coisa que a moça conseguiu responder era que a mãe da Berenice estava morta há 10 anos.
A moça morreu naquela mesma noite. No hospital ninguém viu a tal mulher entrando ou saindo.
FONTE: CIRCULA PELA NET

DESABAFO DE UMA ALMA PERTURBADA - Por Reinaldo Ferraz

Definitivamente não acredito em espíritos. Acredito em fantasmas. Pode parecer estranho, mas deixe-me contar minha história para que possa me entender... antes que eles cheguem. 

Amanheceu um dia lindo de sol. Abri a janela, respirei fundo e... ouvi dois tiros. Me abaixei rapidamente. Fiquei trêmulo. Permaneci imóvel por uns cinco minutos, de olhos fechados e tapando os ouvidos. Quando abri os olhos, ele estava lá. Olhando para mim com seu rosto pálido e assustador. 

Tudo começou nesse dia. Minha mãe voltou correndo para casa para ver se eu estava bem. Disse que um homem tentou assaltar uma moça. O bandido acabou assassinando a jovem e seu filho de dez anos. 

Todos os dias ele está ao meu lado. Seu nome era Robson e, como eu já disse, tinha dez anos. Nunca mais dormi uma noite completa de sono depois daqueles dois tiros. Robson fica todas as noites de pé, ao lado da minha cama, me olhando. Ele não fala nada, mas faz muito barulho. Ele bate as portas do guarda roupa, acende as luzes do quarto e espalha minhas roupas. 

Já falei com minha mãe sobre ele, mas ela acha que estou inventando desculpas para minha bagunça. 

Meu tormento tornou-se maior quando Robson começou a tentar se comunicar comigo. Um dia ele rasgou uma foto dos meus pais ao meio, separando-os. Chorei de raiva e de desespero, mas ele não entendia. Seus olhos ficaram vermelhos de ódio e de sua boca saia um líquido espumoso, que manchava o carpete de casa. Ele avançou contra meu pescoço, mas minha mãe chegou a tempo e ele desapareceu antes que ela o visse. Em outra ocasião, ele pegou a metade da foto com minha mãe e tentou colocar fogo. Por muito pouco não causa um incêndio em meu quarto. 

Certa noite, acordei com um som metálico batendo nos móveis. Quando pude perceber, Robson estava de pé, ao lado da minha cama, apontando uma arma para minha cabeça. Não tive tempo de pensar. Ele apertou o gatilho sete vezes e desapareceu. A pistola caiu no chão. Por sorte, não havia munição na arma. 

Resolvi mostrar para meus pais a arma e tentar contar o que aconteceu. Durante o café da manhã, mostrei a arma para eles. Minha mãe ficou apavorada. Deixou cair a xícara de café que tomava. Meu pai, um pouco mais calmo, me perguntou onde peguei a arma. Eu apenas disse: 

- Uma criança, chamada Robson me deu. 

Dessa vez foi meu pai quem ficou nervoso. Suas mãos tremiam sobre as migalhas de pão. Ele me pediu a arma, deixou-a sobre a mesa e disse já com lágrimas nos olhos: 

- Preciso contar uma coisa a vocês. Essa criança, o Robson, que te acompanha, é seu irmão. Ele era filho daquela moça que morreu há alguns meses atrás. Eu traí sua mãe, meu filho, e voltei a traí-la há algum tempo atrás, até que o destino acabou com a traição da pior forma possível. Não consigo mais esconder isso. Essa criança me perturba todas as noites. Não posso mais conviver com isso. Peço perdão, minha querid... 

Antes de terminar a frase, minha mãe já havia enviado a faca de pão pelo pescoço do meu pai. 

- Pensa que não sei, seu desgraçado? Fui eu quem pegou a arma e matou aquela vagabunda e o pivete que você teve com ela! Não agüentava mais isso! Eu precisava por um fim nisso! E hoje eu o farei! 

Minha mãe passou a faca nos olhos do papai. Ele tentava gritar, mas o sangue que escorria de sua garganta o impedia de fazer qualquer movimento. Ela mordia suas orelhas, arrancando pedaço por pedaço da carne de seu rosto. Não eram mais meus pais. Eram dois demônios encarnados em pessoas. Corri para meu quarto e me tranquei. Lá, encontrei Robson segurando três cartuchos de munição para a arma. Não tive dúvida: Corri para a cozinha, peguei a arma, carreguei-a e atirei nas costas da minha mãe. 

A polícia chegou ao local e não teve dúvidas: Matei meus pais. Hoje vivo trancado aqui no hospital psiquiátrico de Natal. Longe de tudo, da família que me resta, dos amigos e da sanidade mental que eu tinha antes. 

Tenho que encerrar essa história por aqui. Meu pai está aqui do meu lado e me pede para que eu seja breve, pois eles já sabem onde eu estou. Robson e minha mãe estão ai com você, parados do seu lado direito lendo minhas palavras. 

Adeus


FONTE: CIRCULA PELA NET

    O GATO PRETO - conto de Edgar Allan Poe


    Não espero nem solicito o crédito do leitor para a tão extraordinária e no entanto tão familiar história que vou contar. Louco seria esperá-lo, num caso cuja evidência até os meus próprios sentidos se recusam a aceitar. No entanto não estou louco, e com toda a certeza que não estou a sonhar. Mas porque posso morrer amanhã, quero aliviar hoje o meu espírito. O meu fim imediato é mostrar ao mundo, simples, sucintamente e sem comentários, uma série de meros acontecimentos domésticos. 

    Nas suas consequências, estes acontecimentos aterrorizaram-me, torturaram-me, destruíram-me. No entanto, não procurarei esclarecê-los. O sentimento que em mim despertaram foi quase exclusivamente o de terror; a muitos outros parecerão menos terríveis do que extravagantes. Mais tarde, será possível que se encontre uma inteligência qualquer que reduza a minha fantasia a uma banalidade. Qualquer inteligência mais serena, mais lógica e muito menos excitável do que a minha encontrará tão somente nas circunstâncias que relato com terror uma sequência bastante normal de causas e efeitos. 

    Já na minha infância era notado pela docilidade e humanidade do meu carácter. Tão nobre era a ternura do meu coração, que eu acabava por tornar-me num joguete dos meus companheiros. Tinha uma especial afeição pelos animais e os meus pais permitiam-me possuir uma grande variedade deles. Com eles passava a maior parte do meu tempo e nunca me sentia tão feliz como quando lhes dava de comer e os acariciava. Esta faceta do meu carácter acentuou-se com os anos, e, quando homem, aí achava uma das minhas principais fontes de prazer. Quanto àqueles que já tiveram uma afeição por um cão fiel e sagaz, escusado será preocupar-me com explicar-lhes a natureza ou a intensidade da compensação que daí se pode tirar. No amor desinteressado de um animal, no sacrifício de si mesmo, alguma coisa há que vai direito ao coração de quem tão frequentemente pôde comprovar a amizade mesquinha e a frágil fidelidade do homem. 

    Casei jovem e tive a felicidade de achar na minha mulher uma disposição de espírito que não era contrária à minha. Vendo o meu gosto por animais domésticos, nunca perdia a oportunidade de me proporcionar alguns exemplares das espécies mais agradáveis. Tínhamos pássaros, peixes dourados, um lindo cão, coelhos, um macaquinho, e um gato. 

    Este último era um animal notavelmente forte e belo, completamente preto e excepcionalmente esperto. Quando falávamos da sua inteligência, a minha mulher, que não era de todo impermeável à superstição, fazia frequentes alusões à crença popular que considera todos os gatos pretos como feiticeiras disfarçadas. Não quero dizer que falasse deste assunto sempre a sério, e se me refiro agora a isto não é por qualquer motivo especial, mas apenas porque me veio à ideia. Plutão, assim se chamava o gato, era o meu amigo predilecto e companheiro de brincadeiras. Só eu lhe dava de comer e seguia-me por toda a parte, dentro de casa. Era até com dificuldade que conseguia impedir que me seguisse na rua. 

    A nossa amizade durou assim vários anos, durante os quais o meu temperamento e o meu carácter sofreram uma alteração radical - envergonho-me de o confessar - para pior, devido ao demónio da intemperança. De dia para dia me tornava mais taciturno, mais irritável, mais indiferente aos sentimentos dos outros. Permitia-me usar de uma linguagem brutal com minha mulher. Com o tempo, cheguei até a usar de violência. Evidentemente que os meus pobres animaizinhos sentiram a transformação do meu carácter. Não só os desprezava como os tratava mal. Por Plutão, porém, ainda nutria uma certa consideração que me não deixava maltratá-lo. Quanto aos outros, não tinha escrúpulos em maltratar os coelhos, o macaco e até o cão, quando por acaso ou por afeição se atravessavam no meu caminho. 

    Mas a doença tomava conta de mim - pois que doença se assemelha à do álcool? - e, por fim, até o próprio Plutão, que estava a ficar velho e, por consequência, um tanto impertinente, até o próprio Plutão começou a sentir os efeitos do meu carácter perverso. 

    Certa noite, ao regressar a casa, completamente embriagado, de volta de um dos tugúrios da cidade, pareceu-me que o gato evitava a minha presença. Apanhei-o, e ele, horrorizado com a violência do meu gesto, feriu-me ligeiramente na mão com os dentes. Uma fúria dos demónios imediatamente se apossou de mim. Não me reconhecia. Dir-se-ia que a minha alma original se evolara do meu corpo num instante e uma ruindade mais do que demoníaca, saturada de genebra, fazia estremecer cada uma das fibras do meu corpo. Tirei do bolso do colete um canivete, abri-o, agarrei o pobre animal pelo pescoço e, deliberadamente, arranquei-lhe um olho da órbita! Queima-me a vergonha e todo eu estremeço ao escrever esta abominável atrocidade. 

    Quando, com a manhã, me voltou a razão, quando se dissiparam os vapores da minha noite de estúrdia, experimentei um sentimento misto de horror e de remorso pelo crime que tinha cometido. Mas era um sentimento frágil e equívoco e o meu espírito continuava insensível. Voltei a mergulhar nos excessos, e depressa afoguei no álcool toda a recordação do acto. 

    Entretanto, o gato curou-se lentamente. A órbita agora vazia apresentava, na verdade, um aspecto horroroso, mas o animal não aparentava qualquer sofrimento. Vagueava pela casa como de costume, mas, como seria de esperar, fugia aterrorizado quando eu me aproximava. Porém, restava-me ainda o suficiente do meu velho coração para me sentir agravado por esta evidente antipatia da parte de um animal que outrora tanto gostara de mim. Em breve este sentimento deu lugar à irritação. E para minha queda final e irrevogável, o espírito da PERVERSIDADE fez de seguida a sua aparição. Deste espírito não cura a filosofia. No entanto, não estou mais certo da existência da minha alma do que do facto que a perversidade é um dos impulsos primitivos do coração humano; uma dessas indivisas faculdades primárias, ou sentimentos, que deu uma direcção ao carácter do homem. Quem se não surpreendeu já uma centena de vezes cometendo uma acção néscia ou vil, pela única razão de saber que a não devia cometer? Não temos nós uma inclinação perpétua, pese ao melhor do nosso juízo, para violar aquilo que constitui a Lei, só porque sabemos que o é? E digo que este espírito de perversidade surgiu para minha perda final. Foi este anseio insondável da alma por se atormentar, por oferecer violência à sua própria natureza, por fazer o mal só pelo mal, que me forçou a continuar e, finalmente, a consumar a maldade que infligi ao inofensivo animal. Certa manhã, a sangue-frio, passei-lhe um nó corredio ao pescoço e enforquei-o no ramo de uma árvore; enforquei-o com as lágrimas a saltarem-me dos olhos e com o mais amargo remorso no coração; enforquei-o porque sabia que me tinha tido afeição e porque sabia que não me tinha dado razão para a torpeza; enforquei-o porque sabia que ao fazê-lo estava cometendo um pecado, um pecado mortal que comprometia a minha alma imortal a ponto de a colocar, se tal fosse possível, mesmo para além do alcance da infinita misericórdia do Deus Mais Piedoso e Mais Severo. 

    Na noite do próprio dia em que este acto cruel foi perpetrado, fui acordado do sono aos gritos de «Fogo!». As cortinas da minha cama estavam em chamas; toda a casa era um braseiro. Foi com grande dificuldade que minha mulher, uma criada e eu conseguimos escapar do incêndio. A destruição foi completa. Todos os meus bens materiais foram destruídos, e daí em diante mergulhei no desespero. 

    Sou superior à fraqueza de procurar estabelecer uma seqüência de causa a efeito entre a atrocidade e o desastre. Limito-me, porém, a narrar uma cadeia de acontecimentos e não quero deixar nem um elo sequer incompleto. Nos dias que se sucederam ao incêndio, visitei as ruínas. As paredes, à exceção de uma, tinham abatido por completo. Esta exceção era constituída por um tabique interior, não muito espesso, que estava sensivelmente a meio da casa, e de encontro ao qual antes ficava a cabeceira da minha cama. O reboco resistira em grande parte à ação do fogo, fato que atribuo a ter sido pouco antes restaurado. 

    Próximo desta parede juntara-se uma densa multidão e muitas pessoas pareciam estar a examinar certa zona em particular, com minúcia e grande atenção. A minha curiosidade foi despertada pelas palavras «estranho», «singular» e outras expressões semelhantes. Aproximei-me e vi, como se fora gravado em baixo revelo, sobre a superfície branca, a figura de um gato gigantesco. A imagem estava desenhada com uma precisão realmente espantosa. Em volta do pescoço do animal estava uma corda.

    Mal vi a aparição, pois nem podia pensar que doutra coisa se tratasse, o meu assombro e o meu terror foram imensos. Por fim, a reflexão veio em meu auxílio. Lembrei-me que o gato fora enforcado num jardim junto à casa. Após o alarme de incêndio, O dito jardim fora imediatamente invadido pela multidão e por alguém que deve ter cortado a corda do gato e o deve ter lançado para dentro do meu quarto, por uma janela aberta. Isto deve ter sido feito, provavelmente, com a intenção de me acordar. A queda das outras paredes tinha comprimido a vítima da minha crueldade na substância do reboco recentemente aplicado e cuja cal, combinada com as chamas e o amoníaco do cadáver, tinha produzido a imagem tal como eu a via. 

    Tendo assim satisfeito prontamente a minha razão - que não totalmente a minha consciência - sobre o facto extraordinário atrás descrito, não deixou este, no entanto, de causar profunda impressão na minha imaginação. Durante meses não consegui libertar-me do fantasma do gato, e, durante este período, voltou-me ao espírito uma espécie de sentimento que parecia remorso, mas que o não era. Cheguei ao ponto de lamentar a perda do animal e a procurar à minha volta, nos sórdidos tugúrios que agora frequentava com assiduidade, um outro animal da mesma espécie e bastante parecido que preenchesse o seu lugar. 

    Uma noite, estava eu sentado meio aturdido num antro mais do que infamante, a minha atenção foi despertada por um objecto preto que repousava no topo de um dos enormes toneis de gin ou de rum que constituíam o principal mobiliário do compartimento. Havia minutos que olhava para a parte superior do tonel, e o que agora me causava surpresa era o facto de não me ter apercebido mais cedo do objecto que estava em cima. Aproximei-me e toquei-lhe com a mão. Era um gato preto, um gato enorme, tão grande como Plutão e semelhante a ele em todos os aspectos menos num. Plutão não tinha sequer um único pêlo branco no corpo, enquanto este gato tinha uma mancha branca, grande mas indefinida, que lhe cobria toda a região do peito. 

    Quando lhe toquei, imediatamente se levantou e ronronou com força, roçou-se pela minha mão, e parecia contente por o ter notado. Era este, pois, o animal que eu procurava. Imediatamente propus a compra ao dono, mas este nada tinha a reclamar pelo animal, nada sabia a seu respeito, nunca o tinha visto até então. 

    Continuei a acariciá-lo, e quando me preparava para ir para casa, o animal mostrou-se disposto a acompanhar-me. Permiti que o fizesse, inclinando-me de vez em quando para o acariciar enquanto caminhava. Quando chegou a casa, adaptou-se logo e logo se tornou muito amigo da minha mulher. 

    Pela minha parte, não tardou em surgir em mim uma antipatia por ele. Era exactamente o reverso do que eu esperava, mas, não sei como nem porquê, a sua evidente ternura por mim desgostava-me e aborrecia-me. Lentamente, a pouco e pouco, esses sentimentos de desgosto e de aborrecimento transformaram-se na amargura do ódio. Evitava o animal; um certo sentimento de vergonha e a lembrança do meu anterior acto de crueldade impediram-me de o maltratar fisicamente. Abstive-me, durante semanas, de o maltratar ou exercer sobre ele qualquer violência, mas, gradualmente, muito gradualmente, cheguei a nutrir por ele um horror indizível e a fugir silenciosamente da sua odiosa presença como do bafo da peste. 

    O que aumentou, sem dúvida, o meu ódio pelo animal foi descobrir, na manhã do dia seguinte a tê-lo trazido para casa, que, tal como Plutão, tinha também sido privado de um dos seus olhos. Esta circunstância, contudo, mais afeição despertou na minha mulher, que, como já disse, possuía em alto grau aquele sentimento de humanidade que fora em tempos característica minha e a fonte de muitos dos meus prazeres mais simples e mais puros. 

    Com a minha aversão pelo gato parecia crescer nele a sua preferência por mim. Seguia os meus passos com uma pertinácia que seria difícil fazer compreender ao leitor. Sempre que me sentava, enroscava-se debaixo da minha cadeira ou saltava-me para os joelhos, cobrindo-me com as suas repugnantes carícias. Se me levantava para caminhar, metia-se-me entre os pés e quase me fazia cair ou, fincando as suas garras compridas e aguçadas no meu roupão, trepava-me até ao peito. Em tais momentos, embora a minha vontade fosse matá-lo com uma pancada, era impedido de o fazer, em parte pela lembrança do meu crime anterior mas, principalmente, devo desde já confessá-lo, por um verdadeiro medo do animal. 

    Este medo não era exactamente o receio de um mal físico; no entanto, é me difícil defini-lo de outro modo. Quase me envergonhava admitir - sim, mesmo aqui, nesta cela de malfeitor, eu me envergonho de admitir - que o terror e o horror que o animal me infundia se viam acrescidos de uma das fantasias mais perfeitas que é possível conceber. Minha mulher tinha-me chamado várias vezes a atenção para o aspecto da mancha de pêlo branco de que já falei, e que era a única diferença aparente entre o estranho animal e aquele que eu tinha eliminado. O leitor lembrar-se-á que esta marca, embora grande, era, originariamente, bastante indefinida, mas, gradualmente, por fases quase imperceptíveis e que durante muito tempo a minha razão lutou por rejeitar como fantasiosas, assumira, finalmente, uma rigorosa nitidez de contornos. Era agora a imagem de um objecto que me repugna mencionar, e por isso eu o odiava e temia acima de tudo, e ter-me-ia visto livre do monstro se o ousasse. Era agora a imagem de uma coisa abominável e sinistra: a imagem da forca!, oh!, lúgubre e terrível máquina de horror e de crime, de agonia e de morte. 

    Por essa altura, eu era, na verdade, um miserável maior do que toda a miséria humana. E um bruto animal cujo semelhante eu destruíra com desprezo, um bruto animal a comandar-me, a mim, um homem, feito à imagem do Altíssimo - oh!, desventura insuportável. Ah, nem de dia nem de noite, nunca, oh!, nunca mais, conheci a bênção do repouso! Durante o dia o animal não me deixava um só momento. De noite, a cada hora, quando despertava dos meus sonhos cheios de indefinível angústia, era para sentir o bafo quente daquela coisa sobre o meu rosto e o seu peso enorme, encarnação de um pesadelo que eu não tinha forças para afastar, pesando-me eternamente sobre o coração. Sob a pressão de tormentos como estes, os fracos resquícios do bem que havia em mim desapareceram. Só os pensamentos pecaminosos me eram familiares - os mais sombrios e os mais infames dos pensamentos. A tristeza do meu temperamento aumentou até se tornar em ódio a tudo e à humanidade inteira. Entretanto, a minha dedicada mulher era a vítima mais usual e paciente das súbitas, frequentes e incontroláveis explosões de fúria a que então me abandonava cegamente. 

    Um dia acompanhou-me, por qualquer afazer doméstico, à cave do velho edifício onde a nossa pobreza nos forçava a habitar. O gato seguiu-me nas escadas íngremes e quase me derrubou, o que me exasperou até à loucura. Apoderei-me de um machado, e desvanecendo-se na minha fúria o receio infantil que até então tinha detido a minha mão, desferi um golpe sobre o animal, que seria fatal se o tivesse atingido como eu queria. Mas o golpe foi sustido diabólicamente pela mão da minha mulher. Enraivecido pela sua intromissão, libertei o braço da sua mão e enterrei-lhe o machado no crânio. Caiu morta, ali mesmo, sem um queixume. 

    Consumado este horrível crime, entreguei-me de seguida, com toda a determinação, à tarefa de esconder o corpo. Sabia que não o podia retirar de casa, quer de dia quer de noite, sem correr o risco de ser visto pelos vizinhos. Muitos projectos se atropelaram no meu cérebro. Em dado momento, cheguei a pensar em cortar o corpo em pequenos pedaços e destruí-los um a um pelo fogo. Noutro, decidi abrir uma cova no chão da cave. Depois pensei deitá-lo ao poço do jardim, ou metê-lo numa caixa como qualquer vulgar mercadoria e arranjar um carregador para o tirar de casa. Por fim, detive-me sobre o que considerei a melhor solução de todas. Decidi emparedá-lo na cave como, segundo as narrativas, faziam os monges da Idade Média às suas vítimas. 

    A cave parecia convir perfeitamente aos meus intentos. As paredes não tinham sido feitas com os acabamentos do costume e, recentemente, tinham sido todas rebocadas com uma argamassa grossa que a humidade ambiente não deixara endurecer. Além do mais, numa das paredes havia uma saliência causada por uma chaminé falsa ou por uma lareira que tinha sido entaipada para se assemelhar ao resto da cave. Não duvidei que me seria fácil retirar os tijolos neste ponto, meter lá dentro o cadáver e tornar a pôr a taipa como antes, de modo que ninguém pudesse lobrigar qualquer sinal suspeito. 

    Não me enganei nos meus cálculos. Com o auxílio de um pé-de-cabra retirei facilmente os tijolos, e depois de colocar cuidadosamente o corpo de encontro à parede interior, mantive-o naquela posição ao mesmo tempo que, com um certo trabalho, devolvia a toda a estrutura o seu aspecto primitivo. 

    Usando de toda a precaução, procurei argamassa, areia e fibras com que preparei um reboco que se não distinguia do antigo e, com o maior cuidado, cobri os tijolos. Quando terminei, vi com satisfação que tudo estava certo. A parede não denunciava o menor sinal de ter sido mexida. Com o maior escrúpulo, apanhei do chão os resíduos. Olhei em volta, triunfante, e disse para comigo: «Aqui, pelo menos, não foi infrutífero o meu trabalho.» 

    A seguir procurei o animal que tinha sido a causa de tanta desgraça, pois que, finalmente, tinha resolvido matá-lo. Se o tivesse encontrado naquele momento, era fatal o seu destino. Mas parecia que o astuto animal se alarmara com a violência da minha cólera anterior e evitou aparecer-me na frente, dado o meu estado de espírito. É impossível descrever ou imaginar a intensa e aprazível sensação de alívio que a ausência do detestável animal me trouxe. Não me apareceu durante toda a noite, e deste modo, pelo menos por uma noite, desde que o trouxera para casa, dormi bem e tranquilamente; sim, dormi, mesmo com o crime a pesar-me na consciência. 

    Passaram-se o segundo e terceiro dias e o meu verdugo não aparecia. Mais uma vez respirei como um homem livre. O monstro, aterrorizado, tinha abandonado a casa para sempre! Nunca mais voltaria a vê-lo! 

    Suprema felicidade a minha! A culpa da acção tenebrosa inquietava-me pouco. Fizeram-se alguns interrogatórios que colheram respostas satisfatórias. Fez-se inclusivamente uma busca, mas, naturalmente, nada se descobriu. Dava como certa a minha felicidade futura. 

    No quarto dia após o crime, surgiu inesperadamente em minha casa um grupo de agentes da Polícia que procederam a uma rigorosa busca. Eu, porém, confiado na impenetrabilidade do esconderijo, não sentia qualquer embaraço. Os agentes quiseram que os acompanhasse na sua busca. Não deixaram o mínimo escaninho por investigar. Por fim, pela terceira ou quarta vez, desceram à cave. Nem um músculo me tremeu. O meu coração batia calmamente como o coração de quem vive na inocência. Percorri a cave de ponta a ponta. De braços cruzados no peito, andava descontraído de um lado para o outro. Os agentes estavam completamente satisfeitos e prontos para partir. O júbilo do meu coração era demasiado intenso para que o pudesse suster. Ansiava por dizer pelo menos uma palavra à guisa de triunfo e para tornar duplamente evidente a sua convicção da minha inocência. 

    - Senhores - disse por fim, quando iam a subir os degraus. - Estou satisfeito por ter dissipado as vossas suspeitas. Desejo muita saúde para todos, e um pouco mais de cortesia. A propósito, esta casa está muito bem construída (e no meu furioso desejo de dizer qualquer coisa com à-vontade, mal sabia o que estava a dizer). Direi, até, que é uma casa excelentemente construída. Estas paredes... vão-se já embora, meus senhores?... Estas paredes estão solidamente ligadas. - E neste momento, por uma frenética fanfarronice, bati com força, com uma bengala que tinha na mão, na parede atrás da qual se encontrava o cadáver da minha querida esposa. 

    Ah!, que Deus me livre das garras do arquidemónio! Mal tinha o eco das minhas pancadas mergulhado no silêncio, quando uma voz lhes respondeu de dentro do túmulo: um gemido, a princípio abafado e entrecortado como o choro de urna criança, que depois se transformou num prolongado grito sonoro e contínuo, extremamente anormal e inumano. Um bramido, um uivo, misto de horror e de triunfo, tal como só do inferno poderia vir, provindo das gargantas conjuntas dos condenados na sua agonia e dos demónios no gozo da condenação. 

    Seria insensato falar dos meus pensamentos. Senti-me desfalecer e encostei-me à parede da frente. Tolhidos pelo terror e pela surpresa, os agentes que subiam a escada detiveram-se por instantes. Logo a seguir, doze braços vigorosos atacavam a parede. Esta caiu de um só golpe. O cadáver, já bastante decomposto e coberto de pastas de sangue, apareceu erecto frente aos circunstantes. Sobre a cabeça, com as vermelhas fauces dilatadas e o olho solitário chispando, estava o odioso gato cuja astúcia me compelira ao crime e cuja voz delatora me entregava ao carrasco. Eu tinha emparedado o monstro no túmulo!

    PADRE ELIJAH - História de terror do site juliofantasma.com

    Recebo muitas cartas todos os dias.  A maioria possui a mesma pergunta:  “De onde você tira as idéias para seus contos?”.   Eu sempre dou a mesma resposta a todas: “Caro leitor,  meu pai me contava muitas estórias.  Muitos dos meus contos são baseados em personagens destas estórias.  Um grande abraço”.   Peço perdão a todos os meus fãs por ter sido tão sucinto na resposta.   Hoje explicarei o motivo.   Tal resposta implicaria numa volta ao meu passado.   Uma volta á minha infância.   Sendo mais preciso,  uma volta ao dia 26 de Fevereiro de 1930,  que tento apagar da minha memória desde então.   Este maldito dia ainda me assombra terrivelmente.  
    Hoje,  com meus 80 anos,  2 meses e 13 dias de vida,  não tenho mais nada a fazer senão esperar a chegada da Sra. Morte.  Ou seria Sr. Morte?    Mas seria um enorme desperdício eu partir sem contar aos meus leitores o que me aconteceu.  
    Não será fácil colocar os fatos no papel.  Estou velho e cansado,  minhas mãos não têm a mesma coordenação motora d’antes.   O fator psicológico também irá me atrapalhar,  pois terei de recordar cenas desagradáveis.  Imagens perturbadoras. 
    Bom,  peço a Ele que me dê forças para esta árdua tarefa.
     Era primavera em Los Angeles.  Eu tinha 9 anos.  Minha irmã Flavia era a caçula,  acabara de completar 7 anos. Meus pais,  Edward e Lizzy, formavam o mais belo casal que já conheci.   Os dois realmente davam um significado especial para a expressão “Foram feitos um para o outro”.    Ainda hoje eu lamento por não ter vivido uma paixão como a que tiveram.    Mais isso não vem ao caso.

    Meu pai possuía uma pequena fábrica de calçados no centro de Los Angeles.  Chegava em casa todos os dias pontualmente ás 21:35hs.   Mas naquele dia ele se atrasara quase 2 horas.   Chegou em casa com um sorriso quase infantil nos lábios.   
        O que houve?  —  perguntou-lhe minha mãe.
        Nada de mais.  —  colocou o paletó sobre a cadeira da cozinha.  —   Eu estava dando algumas instruções para o Call.  Ele irá ficar no meu lugar durante alguns dias.
    Eu e minha mãe ficamos espantados.  Deixar alguém em seu lugar?   Meu pai nunca ficara um dia longe da fábrica.  Aquilo era a segunda paixão da vida dele.
        Você está doente?  —  perguntou minha mãe.
        Não.  Sabe,  Liz,   hoje eu me dei conta de um fato.  Nunca tirei férias.
        Só hoje você percebeu?
    Foi possível notar um ar de alívio na voz de minha mãe.   Ela se assustava muito facilmente.
    —  Eu estava observando os filhos do Call hoje na hora do almoço.  Aquilo me trouxe muitas lembranças.   Zach e eu.
        Zach?   Seu primo Zach?
        Sim.
        O que houve com ele?   Por quê eu nunca o conheci?  Ele não mo...
        Não.  Quero dizer,  espero que não.   
        Ah,  agora eu me lembrei.   Vocês brigaram na adolescência.   Estou certa?
        Sim.  
        Os dois gostavam da mesma garota.   História clássica.
        Ele se casou com Elizabeth.  Desde então nunca mais nos falamos.  
    Fez-se silêncio.
        Tomei uma decisão esta tarde.  —  disse meu pai.  —  Eu vou lhe fazer uma visita.   Ou melhor,  nós iremos visitá-lo.

    Minha mãe ficara muito entusiasmada com a idéia da viagem.   Como eu já dissera antes,  meu pai nunca se separava da fábrica.   Só deixávamos Los Angeles para fazer compras em alguma cidade vizinha.   Aquela seria nossa primeira saída de casa.
    Meu pai descobrira que o primo Zach ainda morava na pequenina Mason Creek,   e foi com este destino que deixamos Los Angeles na manhã fria de 23 de Fevereiro.

    Faríamos o trajeto num Buick modelo 129.  Apesar dos tempos não estarem tão bons,  meu pai fazia questão de algumas regalias.   Naquela época os carros não possuíam tamanha velocidade como os de hoje,  por isso nossa viagem precisou de um intervalo.   Após um dia inteiro de estrada nós paramos num hotel em Castlebury,  onde passamos a noite.  No dia seguinte outra manhã fria,   mesmo assim partimos.    A viagem fora super tranqüila,  a não ser pelas brigas que eu tinha com minha irmã.   Minha mãe ficava uma fera conosco.   Meu pai não dava a mínima.   
    Como já disse antes,  eu  tinha 9 anos.   Neste período da vida tudo é festa.   Tudo tem o cheirinho de coisa nova.  Bons tempos.

    Chegamos em Mason Creek no começo da noite.  Lembro-me de ter ficado impressionado com a beleza do lugar.  Árvores.  Muitas árvores.   Eu não estava acostumado a ver muitas em Los Angeles.   Chamar Mason Creek de cidade era um elogio.  Vilarejo seria a palavra mais correta.   
    Foi muito fácil achar a casa do primo Zach.   Papai conhecia aquele lugar muito bem.   Afinal ele crescera ali.   Sinto tanto orgulho de saber que meu pai saíra de um lugar como aqueles para se transformar num homem de negócios na cidade grande.
    Dava para sentir que cada vez mais próximo do encontro com Zach meu pai ficava mais nervoso.   A viagem seria em vão?   
    Papai parou o carro em frente a um casebre todo pintado de azul claro.   Apesar de modesta,  era a mais conservada do bairro.
        É aqui, Liz. 
        É difícil acreditar que você tenha crescido aqui.
        Pode acreditar.   É espantoso como não mudou quase nada.   Até vejo minha tia Anny nos perseguindo pelo corredor.   Ah,  meus tempos de moleque!
    Um homem alto aparece na janela da casa.   Papai buzina duas vezes rápidas e deixa o carro.  
        Zach?
    O homem ficou um pouco surpreso.  Fez-se silêncio.
        Eddy?
    Apesar da minha pouca idade eu fiquei emocionado com aquele momento.   Papai e o primo Zach se abraçaram por um longo tempo.   Olhavam-se com espanto e felicidade ao mesmo tempo.

    Elizabeth Dublyn,  a moça responsável pela separação dos dois,  falecera cinco anos após o casamento com o primo Zach.    Os dois tiveram um filho,  Andrew.   O garoto era 3 anos mais velho do que eu e tínhamos quase a mesma altura.  Eu estava adorando mesmo aquela viagem.

    25 de Fevereiro.
    O frio passara e o dia ficara agradável.   Saímos todos para passear por Mason Creek.  Lugar pequeno tem suas vantagens.  Poucas horas foram suficientes para um tour completo.  
    O primo Zach estava maravilhado com o Buick de papai.   Apesar de tantas notícias para colocarem em dia,  o Buick era sempre mencionado.   Onde você o comprou?   Deve ter custado o olho da cara!   Você deve estar muito rico,  primo!
    Na época eu ouvia tudo e resumia a uma palavra:  inveja.   Os anos se passam e você adquire experiência.  Hoje eu chamaria de chantagem psicológica.
    Para mim a viagem já começara a se entediar.  Meu primo Andrew e eu não nos demos bem.   Não havia brinquedos como os meus.   A casa era pequena e apertada para 6 pessoas.    Eu já começava a sentir saudade de casa e dos meus amigos.   Mas no final do dia eu ouvi uma conversa entre meu pai e o primo Zach.   Falavam a respeito de um tio que morava pelas redondezas.   Um tio contador de estórias.   Mathias era seu nome.   Ouvi papai dizer que adoraria revê-lo,  e que talvez o fizesse no dia seguinte.    Lembro-me de ter gostado muito da idéia,  pois minha paixão por ouvir estórias já era muito forte.    Talvez minha verdadeira paixão.

    26 de Fevereiro.
    Papai decidiu visitar o velho tio Mathias.  Saímos logo após o almoço.  O primo Zach e Andrew não quiseram ir, apesar da insistência de meu pai.
    O velho Mathias morava num vilarejo próximo, apelidado de Rio das Pratas. 
    Durante a viagem acabei me lembrando que meu pai já citara o nome do tio Mathias antes.   Disse-me que aprendera a contar estórias com ele.   Ninguém o superava. 
    Fiquei com pena do Buick,  a estrada de terra e esburacada foi um verdadeiro castigo.   Em certos momentos eu pensei que papai acabaria desistindo da visita.   Mas não desistiu.   Encontramos a casa do velho Mathias após 1 hora e 40 minutos de tortura.
    O cenário era ainda mais bucólico que Mason Creek.  Dava para ouvir o barulho dos pássaros e o vento batendo contra as folhas das árvores.  
    Mason Creek e Rio das Pratas exerceram uma certa magia sobre mim,  pois meu costumava contar estórias sobre lugares como aqueles.   Estórias não muito agradáveis.
    O velho Mathias morava com sua esposa Henrieta,  o filho Terrence,  a cunhada Denise e seus três netos.    A casa parecia ser modesta por fora,   mas ao entrarmos vimos o contrário.   Havia muito espaço.   Os móveis eram modestos, quase todos feitos de madeira.   Senti-me bem ali,  a casa possuía um clima diferente da do primo Zach.   Minha irmã finalmente encontrara companheiros para aprontar sua bagunça.  Os três filhos do primo Terrence tinham 6, 7 e 8 anos.
        Sabia que podemos construir uma escadinha com vocês?  —  brincou o tio Mathias,  fazendo referência ás nossas idades.   Falamos cada coisa idiota na presença de crianças.  Por quê será?

    As horas foram se passando e nada do velho Mathias contar suas famosas estórias.   Para piorar as coisas,  minha irmã e os garotos não me davam sossego.  Concordo que eu era só um pouquinho mais velho do que eles,  mas eu era diferente.  Sempre fui.  
    Após o café aconteceu o que eu mais aguardara o tia todo.
        Tio,  não vou embora sem ouvir uma de suas estórias.  —  disse meu pai lavando sua xícara. 
    O velho Mathias lhe sorriu.
        Estou enferrujado,  meu sobrinho.  
        Duvido.  —  respondeu papai,  e olhou para minha mãe.  —  Liz,  você precisava ouvi-lo contar suas estórias.   Eu,  meus primos,  meus outros tios, tias,  todos sentavam ao seu redor para ouvi-lo.    Suas estórias de fantasma não me deixavam dormir por semanas.  
    Abri um largo sorriso neste momento.
        Eram tão assustadoras assim?  —  perguntou minha mãe.
        Ele está exagerando um pouco.  — disse tio Mathias.
        Zach e eu aproveitávamos a época para assustar nossas tias. —  disse meu pai.  —  Você nem imagina o que aprontávamos.
        Coitadas.
        Não importa o que diga,  meu tio.   Não saio daqui sem ouvir uma de suas estórias.
        Os anos se passaram e você continua o mesmo.
        Espero que eu possa dizer o mesmo do senhor.
        Agora eu fiquei curiosa.  —  disse minha mãe.  —  Gostaria muito de ouvir uma destas estórias.
    O velho Mathias se aproximou dela.
        Tudo bem, minha querida.   Se é você que pede contarei.
    Mamãe abriu-lhe um sorriso.   O velho Mathias sentou-se ao seu lado e jogou seu cigarro de palha para longe.
        Irei lhe contar a estória do Padre Elijah.   Ou será que já conhece?  —  e olhou rapidamente para meu pai.
        Nunca ouvi falar.  —  respondeu minha mãe. 
        Antes de começar a estória eu já lhe adianto uma coisa.   Há um fato verídico e outro falso.
        Não vai me contar agora, vai?
        Claro que não!  Faz parte do suspense.
        Tenho a impressão de que vou acabar me arrependendo.  —  disse meu pai. —  Lizzy se assusta muito fácil,  tio. Conte uma mais fraquinha.
        Não lhe dê atenção.  —  disse minha mãe.  —  Não sei se é fraca ou não,  mas estou curiosa para ouvir esta do Padre.
        Você é que sabe, Liz.  — disse meu pai.
    O velho Mathias olhou pra mim.   Pensei que seria o fim.   Será que me expulsariam dali?   Papai me salvou:
        O garoto não se impressiona tão fácil, tio. —  e olhou pra mim. —  Já está acostumado com as estórias do seu pai.  Não é,  filho?
    Apenas balancei a cabeça em sinal de positivo. 
    O velho Mathias ficou pensativo por alguns instantes,   voltou o olhar para minha mãe e começou a estória.   Eu nunca ficara tão atento antes.

    Nossa estória começa no ano de 1840 na pequena cidade de Sparrilla,  no México.   Ali a paz era absoluta.    Dia atrás outro e a rotina era a mesma.    De manhã os homens deixavam suas casas rumo ao campo para trabalhar na colheita.   As esposas cuidavam dos serviços de casa.    As crianças que não acompanhavam seus pais no campo iam para a escolinha,  uma sala de aula improvisada pelos moradores.    Nada de diferente acontecia por ali.   Mas tudo começaria a mudar naquela fria manhã de inverno.
    Thimoti,  o leiteiro,  fazia sua entrega rotineira.   Faltavam apenas oito casas para terminar o serviço.   Entre elas estava a casa do Padre Jonas.    Thimoti desceu da carroça,  encheu a garrafa com 1 litro de leite e bateu três vezes na porta.    Thimoti fazia questão de receber a benção do Padre Jonas todos os dias.   Era algo sagrado para ele.   Dava má sorte não faze-lo,  dizia.   
    Alguns minutos se passaram e nada do Padre Jonas.   Thimoti estranhou a demora,   pois ele nunca o deixara esperando.   Bateu novamente na porta.   Mas nada adiantou,  nem sinal do Padre.   Thimoti resolveu entrar.  A porta estava aberta,  como era de costume entre os moradores.  O silêncio era absoluto.   Thimoti não sabia se era certo o que estava fazendo.   Talvez o Padre perdera a hora,  nada de mais.   Acontece com todo mundo.   Mesmo assim,  Thimoti continuou.   No final da sala havia duas entradas, á esquerda fica a cozinha e á direita o corredor.  O quarto do Padre ficava no final do corredor.    Thimoti já passara por ali várias vezes quando o Padre adoecera.  Visitava-o todas as manhãs,  e recebia sua benção,  é claro.
    Ao entrar no corredor algo pulou sobre ele,  derrubando-o.   Era Dodo,  o cão vira-latas do Padre Jonas.  Forte, patas grandes e muito carinhoso.   Thimoti se esquecera de que nas noites frias o Padre o deixava dormir dentro de casa.   
                         Quase me mata de susto.
    Dodo lambe seu rosto.
                         Você só tem tamanho,  não é?  Bom garoto.  
    Thimoti se levanta.   O cão olha fixamente para a cozinha e começa a choramingar.
                         O que foi,  Dodo?  Está com fome?
    Thimoti olha para trás e vê o Padre Jonas debruçado sobre a mesa, sentado numa cadeira e com o rosto dentro de um prato de sopa.  
                         Oh, meu Deus!  Padre?
    Thimoti se aproximou do Padre e tocou-lhe no ombro esquerdo,  seu corpo gelado e enrijecido foi ao chão.   O Padre estava morto.
    A morte do Padre Jonas chocou a cidade.    Todos o consideravam parte da família.    Sparrilla estava de luto.
    Os dias foram se passando e a paróquia permanecia desocupada.   Era difícil acreditar que o velho Padre Jonas não estava mais ali.   Doía o coração imaginar um substituto.   Depois de tantos anos.

    Era de madrugada, o céu escuro da noite prometia uma tempestade como nunca se vira antes.   Os cães de caça do velho Amadeu não paravam de latir.   Um vento fortíssimo zunia entre as árvores e as janelas da sala batiam ao mesmo ritmo.  
    —  Levanta,  Amadeu,  — disse a velha Glenda, sua esposa. — dê um jeito naquelas janelas antes que eu fique louca!
    —  Trate de dormir, mulher. 
    —  Como posso dormir com uma barulheira destas?
    —  Que culpa tenho eu?   Não posso parar uma tempestade por você, querida!
    —  Ah, mas pelo menos a janela você pode.  Vamos,  levante-se!
    O velho Amadeu voltou a dormir.
    —  Quando mais precisamos de um homem ele não comparece.  Raios!
    Glenda levantou-se,  ascendeu uma vela e foi até a sala.   Agora as janelas estava batendo alternadamente,  o que irritava ainda mais.   
    —  Velho imprestável de uma figa.  Deixa ele,  amanhã......... Oh, meu Deus!  
    Glenda enxerga um vulto atrás da janela.   O vento apaga a vela.  A escuridão fica total.
    —  Jesus Cristo!  —  Glenda fica apavorada.  —   Amadeu!  Amadeu!  Levanta já daí!
    Raios cortavam o céu enxergava-se um vulto diante da janela,  fora da casa.   Aquela imagem deixara Glenda congelada de pavor.   De repente uma mão fria toca seu rosto.    Glenda solta um grito como nunca fizera antes.
    —  Calma,  sou eu.  —  diz Amadeu.
    Glenda lhe dá um tremendo empurrão.
    —  Desgraçado,  por que me fez vir até aqui sozinha?
    —  Você veio porque quis,  mulher.
    Glenda olha novamente para a janela.   Não havia nada do lado de fora.
    —  Tinha alguém me olhando pela janela!
    —  Não tem ninguém te olhando, mulher.   Volta pra cama.  Vamos.
    —  Eu juro!  Tinha alguém ali fora me olhando.  Não volto pra cama sem que você vá lá fora dar uma olhada.
    Neste momento a tempestade começa a cair.
        Você enlouqueceu?  Olha a chuva que está lá fora!
    Algo cruza a janela.   Desta vez Amadeu também vê.
        Mas o que foi aquilo?  —  diz ele.
    Glenda repete 3 vezes o sinal da cruz.
        Eu disse que tem alguém lá fora,  não disse?
        Mas quem seria numa hora destas?
        Ladrão,  ora essas.
        Desde quando Sparrilla tem ladrões?
        Sei lá,  você é o homem da casa,  vá lá conferir.
    Amadeu segurou firme o lampião e dirigiu-se até a porta.    Glenda estava apavorada.
        Cuidado, meu velho. 
    Amadeu abriu a porta e deu de cara com o vulto misterioso.  Seu espanto foi tão grande que o fez pular para trás.    O vulto se aproximou da porta.
        Oh, meu Deus!  Glenda,  é o Padre Jonas!
        Jesus Cristo!
    O vulto adentra a casa.  Usava uma batina.
        Peço-lhes perdão pelo susto. 
        Quem é você?  —  grita Glenda.
    Homem alto,  pele muito branca e algo que chamava a atenção,  sua cabeça.   Era totalmente desproporcional ao corpo grande e comprido.   Não havia um só fio de cabelo,  nem mesmo sobrancelha.  
        Meu nome é Elijah.  Padre Elijah.
        Padre?  Mas que diabos você veio fazer aqui a esta hora?
        Peço-lhes desculpas novamente.   Eu fui enviado para cuidar da paróquia do Padre Jonas.  Que Deus o tenha.   
        Substituir o Jonas?   Não estou sabendo de nada.
        Fui enviado pela Congregação,  meu senhor.   O único jeito de chegar aqui foi pegando algumas caronas pelo caminho.   Só consegui chegar agora.
        Deixe o Padre entrar e feche esta porta,  Amadeu.  —  disse Glenda.  —  Mas que falta de educação!
    Amadeu a obedeceu,  mas não desviou o olhar do Padre Elijah.
        Eu não devia ter aparecido deste jeito,  mas a casa de vocês foi a primeira que encontrei.   Estou exausto.
        Sente-se,  Padre.  Trarei uma xícara de café bem quente.
        Não quero amolar,  minha senhora. 
        Meu nome é Glenda.
        A senhora é muito gentil.
        Ah,  que nada.  —  olhou para Amadeu.  —  Anda, homem,  precisamos arrumar alguns cobertores para o Padre.  —  e voltou o olhar para o Padre.  —  Não temos uma cama sobrando.  Não se importa em dormir no sofá?
        Exausto como estou eu dormiria até no chão.

    No dia seguinte o Padre Elijah se apresentou à cidade.  Sua aparição fora uma surpresa para todos,  ninguém sabia da sua vinda.   “Fui enviado pela Congregação”,  foi o que respondia a todos.    Sua aparência esquisita também chocara alguns moradores.   Padre Elijah teria um grande desafio pela frente.
    Os dias foram se passando e o Padre foi ganhando a simpatia de alguns e a indiferença de muitos.    Suas missas ficavam constantemente vazias,   era raro ver a capela lotada.    Ao longo dos meses foram surgindo muitas estórias esquisitas sobre o Padre Elijah,  muitas delas inventadas pelos próprios moradores que não aprovavam sua presença,   mas algumas eram verídicas.    O Padre possuía algumas manias estranhas,  uma delas era andar pela estrada de madrugada tocando uma gaita velha,  dizem que ele sempre tocava a mesma música.   Há outras estórias sem importância,  mas a que mais chama a atenção é a que ele nunca deixava o sino tocar 12 vezes.   Não importa se era meio-dia ou meia-noite,   o sino nunca chegava ás 12 badaladas,   parava sempre na 11ª.    Dizem que certa noite alguns garotos tentaram invadir a capela para dar a última badalada,  mas viram uma figura estranha tomando conta do sino e saíram correndo como nunca fizeram antes.   Tal estória se espalhou e ninguém teve a coragem de tentar novamente.
    O motivo pelo qual o povo não tentou expulsa-lo eram as aulas de catecismo.   As crianças o adoravam.   Apesar da sua estranha figura, a qual assustava até alguns adultos,   os meninos e meninas da cidade não perdiam suas aulas de sábado á tarde.

    Era início da tarde.  Antonio, o marceneiro,  avista sua sobrinha Stella caminhando sozinha pela estrada.
        Faltou ao catecismo hoje?  —  gritou ele.
        Hoje saímos mais cedo.
        Que merda!   Justo hoje?
    Antonio largou o que estava fazendo,  subiu em sua carroça e partiu rumo á capela.   A esposa de Antonio viajara e este ficara de tomar conta das filhas,  as trigêmeas Marcely,  Angelina e Julie,  de 8 anos.
    Não havia mais ninguém próximo á capela.  Todas as crianças já haviam partido.   Antonio havia dito para as 3 meninas não saírem dali até ele chegar,  mas ele não pensara na hipótese de saírem mais cedo.   Antes de sair de porta em porta procurando pelas filhas,  Antonio resolveu dar uma olhada dentro da capela.  
    Antonio entrou sorrateiramente.  A capela estava vazia.   Mas Antonio ouve alguns ruídos vindo detrás do altar e resolve averiguar.   Ele foi se aproximando e os sons ficavam mais intensos.   Os sons estavam mesmo partindo de trás do altar.   Antonio se aproximou lentamente da porta.    A cena encontrada por Antonio o atormentaria pelo resto de suas vidas.   O Padre Elijah estava mantendo relações sexuais com uma das meninas e as outras duas estavam caídas ao chão, mortas.  Havia manchas de sangue pelo chão e pelas paredes.   Aquilo foi um choque tão grande que Antonio sentiu-se zonzo por alguns minutos.   Padre Elijah não notara sua presença.    Ao recobrar os sentidos Antonio pegou a cruz de madeira que enfeitava o altar e partiu pra cima do Padre,  furiosamente.    Entrou rapidamente e o golpeou violentamente na nunca,  Padre Elijah foi ao chão imediatamente.   A menina ainda estava viva,  era Angelina. Esta tinha cabelos curtos,  o que lhe diferenciava das outras.  Sua genitália sangrava. 
    —  Jesus Cristo!  Mas o que foi que ele fez a você, meu amor? 
    A menina ficou calada,   apenas piscou os olhinhos vagarosamente.    Antonio pulou sobre o Padre e o desferiu-lhe golpes e mais golpes sobre sua cabeça.   Exausto,  Antonio parou e correu até as duas meninas caídas ao chão.   Não havia sinal de vida.   Antonio começou a chorar e gritar de desespero.   Padre Elijah ergueu a cabeça lentamente.  Antonio o olhava com desprezo,  seus dentes serravam de tanto ódio.
        Seu filho da puta desgraçado!  Assassino!  Assassino!
    O Padre ergueu a cabeça e olhou em sua direção.   Havia um sorriso mordaz em seus lábios cheios de sangue.   O ódio de Antonio aumentou ainda mais,  e partiu novamente para cima do Padre ferozmente.    Antonio estava prestes a matar o Padre,  quando alguém entra.  Era Thimoti,  o leiteiro.
        Oh, meu Deus do céu!  O que está havendo aqui?
    Antonio não lhe dá atenção e continua o ataque ao Padre.  Thimoti não suporta aquela tórrida cena e vomita.
        Você vai para o inferno,  seu desgraçado!  —  repetia Antonio.
    Thimoti puxa a cruz das mãos de Antonio.
        O que você está fazendo,  Antonio? 
        Justiça.  Apenas Justiça.

    Padre Elijah morrera ali,  mas o sorriso dos seus lábios ninguém conseguira tirar.   Thimoti e Antonio jogaram seu corpo na mata,  a uns 4 kms da capela.  Angelina sobrevivera.
    Os fatos ali ocorridos rodaram a cidade toda em questão de horas,  chocando e horrorizando por onde passava.    O enterro das duas meninas aconteceu 2 dias depois, reunindo toda a população.   Muitos queriam queimar a capela onde tudo aconteceu,  afinal aquele lugar ainda continuava a ser uma casa de Deus?  Para a maioria,  não.  Mas ninguém tinha coragem de fazer o serviço.
    Algumas semanas depois Angelina desaparecera,  bem como o corpo do Padre.   Antonio enlouquecera,  vindo a falecer 5 meses depois.    Sparrilla nunca mais seria a mesma.   Os anos se passavam e o desaparecimento de crianças ficava cada vez mais comum.    Ninguém tinha dúvida de quem as levava.   O fantasma do Padre fora visto várias vezes perambulando pela estrada tocando sua gaita e de mãos dadas com Angelina.   Uma vez ou outra o sino tocava as 11 badaladas sozinho.   Diziam que se você encontrasse 3 cruzes pelo caminho era sinal de que o fantasma do Padre Elijah iria aparecer.   Nunca falhava.

        Bom,  é isso.  —  disse o velho Mathias. 
    Eu ficara bastante impressionado.   Minha mãe mais ainda.
        Cruzes. — disse ela. — Que coisa horrível.
        Se quiser eu paro por aqui.
        O quê?  Mas ainda não acabou?
        Não se lembra do que eu lhe disse antes de começar a estória?
        Ah,  está certo.  Lembrei.  O senhor disse que havia um fato verídico e outro falso nesta estória. 
        Gostaria de saber qual é qual?
        Depois de tudo que ouvi acho que nada mais me assustaria.   Pode dizer.
        Bom,  a verdade é que ela realmente aconteceu.
        Ah,  acha que vou acreditar?  
        Não espero que acredite.  É fato.
        Falta dizer o que é falso.
        Claro,  agora vem a parte mais importante. — eu nunca me esquecerei do olhar do velho ao dizer esta frase.  Senti meus ossos gelarem.  —  Eu só menti uma coisa.   A cidade onde tudo aconteceu não se chama Sparrilla,  mas Rio das Pratas.
    Senti que mamãe também ficara assustada
        Aqui?
        Sim. Aqui.
        Lembra da capela abandonada que você comentou?  —  disse meu pai.
        Ah,  não pode ser... 
        Pode sim,  é a velha capela do Padre Elijah.  —  disse o velho.
        Você já sabia desta estória?  —  gritou minha mãe para meu pai.
        Claro,  desde minha infância.   Perdi a conta de quantos pesadelos eu tive com o tal do Padre.
    Mamãe olhara para fora da cozinha,  a noite já se fazia presente.
        Agora fala sério.   A parte do fantasma do Padre perambulando pela estrada é estória de pescador,  certo?
        Eu não diria isso para o meu amigo Frank.
        O que tem ele?
        Frank já esteve frente a frente com o Padre.   Pobre Frank,  perdera seu filho de 7 anos.
        Tudo isso é estória,  Edward.   Se tudo isso fosse verdade você acha que seu primo Terrence e a Denise viveriam aqui com seus filhos?
        Meu pai já dizia,  —  disse o velho Mathias.  —  ás vezes tudo é mais fácil nesta vida quando a gente acredita.
        Espere um momento,  — disse minha mãe. —  o senhor está dizendo que seus netos estão seguros porque vocês acreditam no tal fantasma?
    O velho não lhe respondeu,   virou-se para a janela e olhou para a escuridão lá fora.

    A lua e as estrelas já se faziam presentes.   Papai queria voltar para Mason Creek de qualquer jeito.   Mamãe,  apesar de tudo que dissera ao velho Mathias,  ficara assustada com a estória.   Minha irmã abriu o maior berreiro ao saber que iríamos embora,  já que se entrosara muito bem com meus primos.   Eu sentia calafrios só de pensar que passaríamos tão perto da famosa capela.
    O relógio de papai marcava 20 horas e 37 minutos quando deixamos a casa do velho Mathias.    Minha irmã dormira com a cabeça no meu colo.   Coitadinha,  estava exausta.
        Seu tio é uma tremenda figura.  —  disse mamãe.
        Sempre foi.
        Você não acredita nesta estória, acredita?
        Eu Sabia.  Você ficou impressionada.
        Eu?  Claro que não.
                         O velho Mathias continua o mesmo.   Maldito velho,  — papai sorriu. —  sempre foi um mestre.
        Não fiquei impressionada.   Apenas curiosa.
        Tudo bem,  você me perguntou se eu acredito.  Bom,  na minha infância eu tive um amigo que desapareceu misteriosamente.   Na época disseram que fora o tal fantasma do Padre que o levara. 
        Mas você acredita?
                         Você me conhece muito bem.  A resposta é óbvia.  Eu não vi o fantasma,  portanto não acredito.
    Mamãe permaneceu calada por alguns minutos.    Enquanto isso minha irmã acordou.  Flavia adorava ficar de pé sobre o banco de trás,  olhando pela janela.   Num certo trecho da estrada eu percebi que ela estava abanando a mão, sorrindo e olhando fixamente para escuridão lá fora.
        O que está fazendo?  —  perguntei.
    Flavia ainda não falava perfeitamente,  mas deu pra entender que ela dissera algo como:
        Dando tchau para a menininha.
    Olhei imediatamente para a estrada e não vi absolutamente nada,  a escuridão era quase total.
        O que foi, meu anjo?  —  perguntou minha mãe a Flavia.
    Flavia lhe deu a mesma resposta.   Mamãe olhou para trás e pediu para ela se sentar.  Ao voltar o olhar para a frente ela enxergou uma cruz na beira da estrada.  
        Você viu aquilo?
        O quê, Liz?
        Uma cruz!
        E daí?
        Eu não me lembro de ter visto cruz alguma hoje de manhã.
                         Porque você não ouvira a estória hoje de manhã.   Liz,  controle-se,  você vai acabar assustando as crianças.
    De repente mamãe grita.   Acabávamos de passar por outra cruz.   Passara bem do meu lado.    Naquele momento eu comecei a travar uma luta com minha memória.  Aquelas cruzes já estavam ali de manhã.    O pior era que eu não me lembrava.   Mamãe começara a ficar histérica.
        Já foram duas!
        Liz,  pelo amor de Deus,  acalme-se!
                         Não tinha cruz nenhuma hoje de manhã.  Admita.  Está acontecendo alguma coisa muito estranha aqui.
        Estas cruzes já estavam aí, sim.
        Edward,  pare este carro,  olhe nos meus olhos e diga isso novamente.   Você sabe muito bem que estas malditas cruzes não estavam aqui!
    Papai começou a rir.  Mamãe ficou furiosa.
        Edward,  ou isso aqui é uma brincadeira de muito mau gosto ou....
    Uma terceira cruz surge no meio da estrada.  Papai passa o Buick por cima,  e pára.
        Não fizemos brincadeira nenhuma, Liz.
    Mamãe começou a chorar.
        Então só pode ser uma coisa.
        Calma.  Você vai acabar assustando as crianças.
    Eu já estava assustado há muito tempo.
        Você está chorando, mamãe?  —  perguntou Flavia.
        Não,  meu anjinho.  Não estou.  
    Meu pai descera do carro.
        Aonde você vai?  —  perguntou minha mãe.
        Ver que brincadeira é esta.
    Mamãe vira para trás e chama minha irmã.
        Vem aqui com a mamãe.  —  e olhou para mim. —  Papai já volta,  meu bem.
    Mas não voltou.   Sumira na escuridão.   Mamãe entrara em pânico.   A cada 20 segundos ela esticava a cabeça para fora do carro e gritava o nome do meu pai.   Eu queria tanto ter ido atrás dele,  mas o pavor me congelara até os ossos.
    De repente um vulto aparece ao lado do carro,   bem ao lado de minha mãe e minha irmã.   Naquele momento eu já sabia que não era meu  pai.   Eu só torci para estar errado quanto ao visitante misterioso.   Mas eu não estava.   O corpo grande,  a cabeça pequena e o sorriso sádico no rosto.   Era o fantasma do Padre Elijah,  que agora olhava para nós do lado de fora do carro.    Mamãe começou a gritar como eu nunca a vira antes.   Lembro-me de sentir meu coração quase pular para fora de meu corpo.   Minha irmã era a única que não dera a mínima.
    Mamãe,  num ato de desespero,  sentou-se de frente para o volante e tentou dar a partida no carro.   Mas havia um problema,  ela não sabia dirigir.   Foram várias tentativas,  até que na sétima o carro pegou e batemos violentamente numa árvore na beira da estrada.
    Quando recobrei meus sentidos vi mamãe deitada sobre o volante,  desacordada.   Flavia não estava mais conosco.  De repente o sino da capela começou a tocar.  Uma,  duas,  três,  quatro,  cinco,  seis,  sete,  oito,  nove,  dez,  onze badaladas.

    Meu pai e minha irmã nunca foram encontrados.   Minha mãe se suicidou 3 meses depois.    Eu me tornei um escritor de sucesso,   apesar de que trocaria tudo que tenho para encontra-los novamente.